segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

O ENCANTO DO DESENCANTO

Nas andanças da vida ao adentrar na adolescência e primeiros anos da juventude, o auto-questionamento sobre: coerências, incoerências, moral, ética, honestidade, relacionamentos, amizade, afetividade, sexualidade, sexo, sonhos, desejos, vontades, fidelidade, lealdade, prosperidade, espiritualidade, doutrinas, religiões, religiosidade, atitudes e comportamentos se intensificaram no âmago.
Fase em que vivenciamos um período de dada arrogância, prepotência e pretensão do saber. Equivocadamente acreditando que existia “o certo e o errado”, “o ser certo e o ser errado” e ao mesmo tempo certa desconfiança com os ensinamentos e aprendizados.
Haveria de fato uma pura e exata medida para discernir, compreender, aceitar, respeitar e dimensionar os respectivos caminhos, escolhas e o jeito de ser de cada um? Se somos iguais, por que somos diferentes? Algo não bate, mas o quê?
Ao mesmo tempo em que aquela suposta arrogância e pretensão batiam-nos radicalmente a porta ao acreditar em dogmas, padrões, moral imposta e auto-imposta, justamente por sentirmos uma coisa e nos condicionarmos a pensar e agir de outro modo em prol das convenções sociais.
Algo dentro do âmago sinalizava-nos que havia ausência de sentido e dissonância em todo aquele sentido e direcionamento. Nem tudo o que os adultos ensinavam fazia sentido a nós. Nem tudo o que as doutrinas e os mais velhos clamavam e obrigavam, tinha sentido ao âmago. O que nos fazia navegar por entre sentimentos ambivalentes como segurança e insegurança; certeza e incerteza; medo e coragem; desejo e repulsa. Era e não era, tinha e não tinha sentido, e por quê?
Desenvolvemos um mecanismo de defesa, que por vezes fabricam armadilhas do pensar e agir, na busca de reconfortar o sentir.  No nosso caso se dava no colorir as situações e pessoas. Equivocadamente acreditávamos que aceitávamos as situações e pessoas, mesmo que essas expressassem atitudes, comportamentos e resultados divergentes dos nossos valores. Uma auto-imagem de cabeça aberta a diversidade e ao amor universal, que distorcia-nos o quadro e o contexto, ao introduzirmos cores, formas e movimentos que na verdade negavam a realidade para aceitar as “verdades”.   
Ouvir que nem tudo tinha um porque nos deixava numa tremenda agonia e caos interior. Como assim? Por que nem tudo tem por quê?
Os sussurros sem dia, tempo ou hora que de dentro emergiam, nas vozes do interior a nos inspirar e nos elevar naquela imersão de reflexões, insights, ao mesmo tempo em que nos apaziguavam sabiamente nos inquietavam na pureza e leveza.
A deslumbrante descoberta do encanto e dos estados de encantamento do desencanto, exigiu-nos imenso esforço interior no sentido de revisão interior de valores, padrões, conceitos, empatia, reconhecimento e abertura emocional genuína.
Numa rica vivencia (ano 1998 - 2000) na qual por puro êxtase e insight na vivência do estado pós-ressaca emocional, batizamos de o encanto do desencanto, é que encaramos nosso inconsciente “óculos de lentes cor de rosa”.   
Clarificando vivenciamos uma fase e situação de pleno encantamento, e posteriormente diante ao mesmo cenário sentimos um pleno desencanto, fazendo sentir-nos enganados. E nesse cenário, lá estávamos naturalmente e inconscientemente a colorir a situação e os outros, quando um querido amigo, expressou de modo ríspido e enfático:
- "Elaine, o outro não vai mudar, não vai agir diferente, não fez sem querer. Ele sabe o que faz, é de caso pensado e bem pensado. Há má fé e você já intui e sabe disso, porém esta se negando a enxergar. Vamos acabar com isso agora, e coloque essa pessoa pra fora ou ela continuará aprontando, e a tendência é só piorar, aproveitando-se da sua boa fé e pureza. Sim, no mundo há muita gente boa! Há quem faça sem querer e ou pensar! Há também quem faça de má fé e maldade de forma pensada e planejada. Já está na hora de você tirar esses “óculos cor de rosa”".
Entrei em choque e suspensão. O que chamo de entrar no giro 360 do âmago. De fato era uma situação reincidente e por parte da liderança de uma mesma pessoa apoiada por um mesmo pequeno grupo. De fato eu já havia intuído desde a primeira situação, sim eu já vinha observando, eu já havia experimentado a sensação de “má fé”, “desvio de caráter”, “caso pensado”. Porém enxergar aquilo era tão cruel, que me fazia sentir cruel intuir e ter aquelas sensações em relação aos outros. O medo de agir com injustiça, sentir o desejo ou efetivamente punir o outro com crueldade, era por de mais ameaçador ao âmago.  
Até então, por diversas vezes já havíamos ganhado em algumas situações “fama” e ou “rótulo” dê: lunática, sonhadora, idealista, revolucionária, ingênua, boba, Alice e Poliana. Porém esses rótulos não nos abatiam. Na verdade esses rótulos até em algumas situações gerava em nós certo gozo interior de proteção e auto-proteção, máscaras boas que nos ajudavam a ganhar tempo para melhor digestão, solução e convivência.
Usávamos de algumas máscaras de modo consciente, para nos proteger e afastar da nossa zona espacial situações e pessoas invasivas. Por saber e sentir coisas que os outros não percebiam e outras que percebiam, o uso dessas nos ajudava a ganhar tempo para melhor adaptação, criatividade e conforto existencial. E apenas o continuo incomodo, quando não ouvíamos nossa tão aguçada intuição.
Sentíamos muito mais afinidade com a expressão de outra querida amiga que por assim dizer nos definia, como “Plena Lucidez regada a Compaixão”.
Uma lucidez tão clara, quê tornava apavorante, sendo mais fácil limitar como lunática ou sonhadora. Pura lucidez, pureza, compaixão e benevolência, no esforço contínuo para exercitar a inteligência do perdão e auto-perdão. O desafio era dosar e  descobrir como equilibrar intuições e o que vislumbrava.  
O uso de “óculos com lentes cor de rosa”, nos era um mecanismo defensivo inconsciente que nos ajudava a acreditar que aceitávamos o que não aceitávamos. Quando na prática apenas nos ajudava a conviver melhor com os sentimentos e sensações desconfortantes, ajudando-nos a ganhar tempo, até transmutar as reações, tornando-nos mais cautelosos e menos reativos a realidade.  
As máscaras boas e conscientes eram tranqüilas de absorver, encarar, transmutar, desfazer quando já era o momento, quando já não mais precisávamos delas. Porém as máscaras boas e inconscientes requerem maior tempo e cuidado para retirar. E a máscara “óculos cor de rosa” era boa e inconsciente, e já estava tão submersa que ao ter que encontrá-la e encará-la entramos na “pane geral”. O quadro era outro e ou era o mesmo quadro?
Uma profunda inquietação produtiva, nos fez duvidar, questionar e cobrar coerência entre “discurso e postura”, “teoria e prática”, debatia-nos de corpo e alma, logo batíamos em tudo e todos que estivessem ao nosso redor no sentido da quebra de confiança e perda da fé do cenário. 
E no desalento do desencanto observamos que havia ali codificado a repetição de um ciclo, e então nos indagamos:
  1. Tudo é de fato farsa, hipocrisia e mentira leviana?
  2. De fato as pessoas apregoam uma coisa e fazem outra?
  3. Todo lugar e todas as pessoas são assim tão incoerentes e incongruentes, ou tem algo mais nesse cenário para se enxergar?
  4. Alguém que age de má fé, caso pensado e na maldade, deve ser punido e repelido?
  5. Aceitar genuinamente alguém requer considerar o que se é. Se nego a existência de alguém com “desvio de caráter”, se nego a capacidade de alguém sentir prazer atacando e fazendo mal a outrem e ou a vida, deixo de aceitá-lo, uma vez que ao invés de considerar sua existência, o que o significa incluí-lo integralmente, estou renegando o seu jeito de ser e se manter existente. Isso me faz sentir que mais do que aprender a “separar o mal do malfeitor”, eu preciso aprender a reconhecer a existência de diferentes espécies e jeito de ser e se fazer existir, aprendendo a conviver com isso.
  6. Como posso conviver e aceitar diferentes espécies, sabendo me preservar e conservar? Como delimitar os espaços, sem limitar a mim ou ao outro?
Uma saudável melancolia abateu-nos, insights, nos sinalizavam a necessária serenidade e cautela, para melhor discernir, considerar e decifrar o cenário.
Decidimos por escolha intuitiva nos aproximar um pouco mais e descobrir o lado doce do amargor, o lado refrescante do sabor cítrico. O que tínhamos a aprender? O ápice estava se repetindo, qual seria o sentido?
Daquele estado de profundo desencanto, surpreendentemente emergiu o deleite do re-encanto, durante o estado de contemplação. Nos permitir a experiência daquela dor de modo mais sublime, nos possibilitou degustar e aceitar, sem colorir o quadro e o cenário. Ajudou-nos a reconhecer beleza e pureza no deserto e na inundação algo de esplendoroso.
Sentimos uma inexplicável compaixão, o perdão natural fluindo do âmago aguçando a percepção de “realidade” e “verdade”, “proposta de vida” e “postura de vida”. Que indescritível e rica experiência o vivenciar a incondicional consideração do outro e da situação, sem “óculos de lentes cor de rosa”, sem distorções.
O encanto do desencanto explodiu no pleno êxtase do reconhecer o outro, a situação, o cenário, o quadro e as pessoas em processo de formação, transformação e mutação. Literalmente o que chamamos de mágico, se deu bem diante dos olhos. Sentindo uma tranqüilidade saborosa e encantadora, a percepção de que os desencantos tinham seu encanto “o estar em processo”.
Nossa natureza mista do “ser inquisitiva, introspectiva, reservada e extrovertida, multidão e cume da montanha”, degustando a diversidade de sabores do encanto, desencanto, re-encanto, encanto do desencanto e desencanto dos encantos, mesmo que inconsciente, tornou-se mais plena.  
Na jornada o estado de encanto e desencanto, sempre a nos sondar, ao brindar-nos com a diversidade de situações, desafios, conflitos, prazer, alegria, medo, inseguranças, seguranças, certezas, incertezas, fé, perdão, compaixão, apoio e amor.
O encanto do desencanto se dá no movimento de se aproximar do fato, e permitir-se a desapegar-se de “verdades” ao apreciar a realidade, e voltar a se encantar, descobrindo que o quadro não é, está. E isso é tão puro, tão sublime que tamanha pureza nos faz encantar e descobrir o que tem de encantador nos desencantos.

Com ternura,
Sentimentos e Pensamentos Vivos
Por – Elaine Souza – SP. 11/12/2011 – 23h05min

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